O
ESTADO INTERMEDIÁRIO E O MUNDO DOS MORTOS
TEXTO:
Lucas 16:19-31
INTRODUÇÃO
Para nós, que acreditamos na Palavra de Deus,
não somente temos consciência da realidade
da morte, como aceitamos o ensino da
imortalidade da alma, ou seja, temos convicção de que o homem possui uma
constituição que transcende à morte física e que o corpo aguardará o dia da
ressurreição.
Se nós admitimos haver ressurreição do corpo e
que a alma não morre, logo temos que admitir outra realidade, a de que os mortos existem em algum lugar em situação
de consciência ativa. Essa é a Doutrina escatológica do Estado
Intermediário e do Mundo dos Mortos, como veremos neste estudo.
Não basta apenas aceitar essa doutrina Bíblia,
mas, preparar-se contra as heresias que surgem concernentes a esses assuntos, a
fim de receber a consolação pela certeza de que a vida não termina na
sepultura. Foi esse o motivo de Paulo combater a ignorância dos tessalônicos e
concluir seu argumento dizendo: “consolai-vos
uns aos outros com estas palavras” [I Ts. 4: 13,14,18].
1.
O ESTADO E O MUNDO DOS MORTOS
1.1
O Que é o Estado Intermediário. Estado Intermediário é o conceito teológico da existência humana entre
a morte física e a ressurreição. Nesse estágio, o corpo permanece inativo na
sepultura e a alma-espírito existe em condição de plena consciência, tanto em
relação às lembranças do mundo físico
[Lc. 16:25,27,28], como a manifestação de
sentimentos [Ap. 6:9-11] e à convicção do destino esterno
[Lc.16:28].
1.2 A
Realidade do Lugar do Morto: Se é real a existência humana após a morte, é
certo dizer, também, que existe um lugar para onde os mortos vão após a saída
da “terra viventes”. Vejamos:
a. O Que é o Lugar dos Mortos: No AT o termo hebraico She’ol e no NT o termo grego Hades.
Significa, com as devidas exceções, “o
lugar das almas desencarnadas onde os mortos ficam até a ressurreição de seus
corpos”. É claro que se tratando de coisas espirituais, não se pode pensar
num lugar com estruturas físicas, no entanto, se a alma é uma coisa real o
Lugar dos Mortos também o é.
b. Onde
Fica o Lugar dos Mortos: Os teólogos concordam, majoritariamente
, que She’ol/Hades está situado nas
profundezas da terra [Cf. Ef. 4:8-10;
Cp. Nm 16.30,33; Am. 9.2]. Concordam com isso várias expressões alusivas ao assunto, mostrando aquele que morre “descendo”. [Cp. Gn. 37:35; Sl. 30:3;
86:13; 139:8; Ez. 31:15,17; Am. 9:12, etc].
1.3
O Equívoco Doutrinário sobre o Lugar dos Mortos: Devido à imperfeição
de algumas traduções das Escrituras e imaturidade
doutrinária de alguns, muitas controvérsias têm surgido em relação ao Lugar
dos Mortos. Vejamos os principais equívocos:
a. She’ol
- Hades x Sepultura: O problema se dá, principalmente no AT, por
conta de palavras polissêmicas [aquelas
com vários significados] como as palavras portuguesas manga
e vela, por exemplo. O termo She’ol aparece mais de 70 vezes tendo
mais de um significado; diversas vezes é traduzido como sepultura: ora acertadamente, por força da
polissemia hebraica, [Sl. 6:5; Cf. 115:17; Ec. 9:10; Is. 38:17,18 ], ora, equivocadamente por descuido dos
tradutores [Pv. 7:27]. Certo é que o estudante bem esclarecido entenderá
nitidamente os textos onde She’ol, jamais
pode se referir à sepultura, pois na nesta não existe nenhuma tipo de
existência e ação dinâmica como alguns textos demonstram [Cf. Is. 14:9; Sl. 55:15; Am. 9:2]. Além do mais, o she’ol é visto como um lugar onde os ímpios são atormentados
[Sl. 9:17; Hc. 2:5 Ez. 32:17-32]. No
NT o conflito se dissipa porque os escritores diferenciam sepultura [gr. mnomeion] do Lugar dos Mortos [gr. Hades] e, quando citam passagens do
AT onde she’ol se refere ao Lugar dos
Mortos, sempre usavam a palavra correlata Hades
e não mnomeion. [Cp. Sl. 16:10; At.
2:27 ]. A ideia neotestamentárias da vida pós-túmulo sempre aponta para uma
existência consciente, por isso Paulo desejava “partir para está com o Senhor” [Fp. 1:23; 2 Co. 5:8; cp. Lc.
23:43].
b. Hades x Purgatório: O catolicismo ensina que as almas daqueles que morrem em estado de
graça, mas não estão totalmente limpos, passam por um processo de purificação
ou castigo temporário como uma forma de preparação para entrarem no Céu. A
ideia, que se baseia na interpretação particular de 1 Coríntios 3:12-15, foi
introduzida por Agostinho no Séc. IV, mas a palavra só foi usada no Séc. XII, e
se tornar dogma no Concílio de Trento [1545-63.
Esse ensino além de trazer controvérsias escatológicas, anula a eficácia
do sacrifício de Cristo, como única provisão divina para a salvação [Ef. 2:8,9;
Tt. 3:8].
c. She’ol
- Hades x Inferno - Outro equívoco, presente no AT e NT é a
tradução dos termos she’ol e Hades para inferno. O Hades e o Inferno são dois lugares
diferentes, mas às vezes são confundidos. Vejamos alguns exemplos:
·
“Mas não
sabem que ali estão os mortos, que os seus convidados estão nas profundezas do inferno
[she’ol]” [Pv. 9:18] É uma
tradução equivocada porque no Inferno final, ainda não existe ninguém lá. O
mesmo pode-se dizer de Lucas 16:23. O rico estava no Hades e não no Inferno propriamente dito.
·
“... e
tenho as chaves da morte e do inferno [Hades]” [Ap. 1:18]. Não se refere às
chaves da “casa do Diabo” como dizem alguns avivalistas, trata-se do domínio de
Cristo sobre o Hades. As almas não têm autonomia para entrar ou sair de lá [cf.
Lc. 16:26; 2 Sm. 12:23] todos estão sob o domínio de Cristo.
·
“E olhei, e eis um cavalo amarelo; e o que
estava assentado sobre ele tinha por nome Morte; e o Inferno [Hades] o
seguia...”[Ap. 6:]. Fala da
matança desenfreada na Grande tribulação, de modo que aparece o instrumento de
destruição - a Morte e Lugar para
onde os mortos serão introduzidos - o
Hades.
·
Há muitas outras traduções equivocados, porém,
nenhum é mais confusa do que Apocalipse 20:14 que diz: “E a morte e o inferno foram lançados no lago de fogo”
[grifo nosso]. A palavra traduzida por inferno se refere ao Hades e a expressão “Lago de Fogo”, essa
sim, refere-se ao Inferno
propriamente dito, lugar sofrimento eterno. [vide 3.3].
·
OBS: Embora
haja os equívocos, algumas vezes, em que a palavra Inferno aparece nas traduções de português se referem, de fato, ao
Lugar de tormento eterno, mas o termo original não é Hades. Ex. Mateus 5:29, 10:28 e 23:33 [Inferno = gr. geena] e em
2 Pe. 2:4 [Inferno = gr. tártaro] O
problema é que a palavra inferno é de origem latina inferus = “lugares baixos”
que se transformou em Infernus, e que
os tradutores usaram para substituir as palavras gregas Hades, Geena e Tártaro e por vezes, produz grande confusão.
2.
O LUGAR DOS MORTOS ANTES DA RESSURREIÇÃO DE
CRISTO
2.1 Um
único Lugar, Três Compartimentos: Não é unanimidade entre os teólogos a
ideia de que, antes da morte e ressurreição de Jesus, o She’ol fosse um único lugar para onde iam todos os mortos, porém,
esse pensamento sobressai no meio evangélico. Para alguns, mesmo no AT, os
ímpios “desciam” e os justos “subiam” após a morte. [Cp. Lc.
16:23]. Nessa interpretação, o she’ol é o lugar para onde vão as almas
dos ímpios e as “nações que se esquecem
de Deus” e não dos fiéis [cf. Sl. 9:17; 55:15]; os justos, porém, “serão recebidos em glória” [Sl. 73:24].
Porém, parece mais razoável, entre os pentecostais a ideia de um Lugar dos Mortos para todos [Gn. 37:35;
Is. 38:10; Dt. 32:22 NVI], um Lugar nas profundezas da Terra, tendo um compartimento para os justos,
chamado Seio de Abraão e um Lugar de
Sofrimento para os Ímpios, sendo separados por um grande abismo, conforme o
texto de Lucas 16:19-31.
2.2
O Seio de Abraão: o Paraíso dos Justos: O texto supracitado diz que Lázaro “morreu e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão” [v.22]. A
expressão “foi levado”, chama-nos
atenção para o fato de que a Bíblia diz que os justos são recolhidos,
oferecendo-nos a ideia de um estágio melhor [cf. 2 Cr 34:28,
Nm. 20:24,26; 2 Rs. 22:20]. O epíteto Seio de Abraão [paraíso] se refere a uma das três expressões usadas
pelos judeus para se referir ao estado de futuro de bem-aventurança. As outras
duas eram Jardim do Éden e Trono da Glória. A teologia judaica
incluía o “Seio de Abraão” como parte
de descanso e consolo do She’ol, onde
ficavam as almas dos justos, gozando as bênçãos de forma provisória e
incompleta, pois o melhor ainda está por vir com a glorificação do corpo no dia
do arrebatamento da Igreja.
2.3 O
Lugar de Tormento: O texto lucano diz que o rico também morreu e foi
sepultado. [v.23]. Não se faz menção de uma busca angelical, aliás, a Bíblia
diz que os ímpios são ceifados [cp. Sl 37:2; Ap. 14:19]. Jesus acrescenta a
informação “no Hades, [o rico] ergueu os
olhos, estando em tormentos...” [v.22 ARC 2009]. Isso mostra que, esse
compartimento, em contraste com o Seio de
Abraão, já é sombrio, doloroso, e abrasador, mesmo que de forma provisória,
pois rico chega a dizer que estava atormentado.
[v.24]. Não tem como escapar. Só Deus, pela Sua onipresença, tem acesso direto
ao Lugar dos mortos [Sl. 139:8], pois, “o
She’ol está nu perante Ele” [Jó 26:6; Pv.15:11]. No Hades os incrédulos estão sob a égide de Deus, reservados para o
castigo eterno. [2 Pe. 2:4,9].
2.4
O Abismo Divisório: As Cadeias da Escuridão: É dito no texto em apreço que Abraão respondeu ao rico: “... além disso, está posto um grande abismo
entre nós e vós...”.
[v.26, grifo nosso] O terceiro
compartimento, que, aliás, dividia o Seio de Abrão do Lugar de Tormento é
chamado de “grande abismo”. Estudiosos
da bíblica afirmam que se trata “das
cadeias da escuridão”, onde estão presos um grupo de demônios, reservados
para o dia do julgamento dos anjos caídos [2 Pe. 2:4; 1 Co. 6:3]. Pedro afirma que Deus os lançou no Inferno [gr. Tártaro = o mais profundo do abismo], como punição temporária de
um pré-julgamento, até o dia da penalidade definitiva, ideia confirmada por
Judas em sua epístola [Jd. 6]. Acredita-se que estes demônios serão soltos,
provisoriamente, como uma forma de castigo aos que experimentarão a Grande
Tribulação, quando o poço do abismo será aberto [cf. Ap. 9:1-5].
3.
O LUGAR DOS MORTOS APÓS A RESSURREIÇÃO DE JESUS
2.1 A Transferência
do Paraíso: Uma das mais belas promessas de Cristo à Igreja é a de que “as portas do inferno [Hades] não
prevalecerão contra ela”. Essa promessa se torna bem mais robusta diante das
passagens de Efésios 4:8-10 e Ap. 1:18 que abordam a abrangência da obra
redentora de Cristo, trazendo benefícios até aos que já dormiam na fé.
a. A Ida de Jesus ao Hades:
É certo dizer, que com a encarnação, Jesus assumiu todas as condições
humanas, tanto no estágio da vida como na morte [Hb. 2:14]. Logo, como todos os
mortais, seu corpo foi sepultado e sua alma foi ao Hades. Ele disse ao ladrão
crédulo: “... hoje estarás
comigo no Paraíso” [Lc.
23:43]. Ele não usou a palavra Hades, e
sim Paradeisos, pois, certamente o
ladrão conhecia a doutrina do descanso no “Seio de Abrão”. Ao morrerem, ambos
foram ao Mundo dos Mortos. Assim, Aquele que subiria “acima de todos os céus” [Ef. 4:10] descia às “profundezas da Terra” [v.9] para encerrar seu estágio de humilhação
e celebrar o seu triunfo sobre a morte [Ap.1:18]. Pois, a profecia previa que
nem seu corpo sofreria a destruição, nem sua alma permaneceria no Hades [At.
16:10]. A expressão “fui morto, mas eis
aqui estou vivo para todo o sempre” [Ap.1:18] caracteriza-se como o grito
da vitória. [cp. Mt. 28:18].
b. A Mudança do Paraíso: Paulo anuncia o argumento sobre o triunfo
de Cristo citando a poesia profética do Salmo 68:18, ao dizer “subindo ao alto, levou cativo o cativeiro e
deu dons aos homens” [cf. Ef. 4:8]. É entendido desta afirmação que com a
ressurreição, Jesus inicia o sentido inverso de sua encarnação: sua exaltação
triunfante. Ao ascender aos céus, transferiu as almas dos justos para cima [um estágio de antegozo], como havia
prometido [Lc. 16:22], e, a partir de então o Paraíso foi mudado
para o terceiro céu [ Cf. 2 Co 12:1-4]. João viu as almas dos mártires da Grande
Tribulação, debaixo do altar, no céu [ Ap. 6:9].
3.2 A Nova Configuração do Lugar dos Mortos:
A concepção teológica como acima citado, mostra que depois da morte de Cristo,
mas precisamente depois de Sua ressurreição e ascensão o Lugar dos Mortos passou
a ter uma nova estrutura: os ímpios continuam descendo ao Hades, numa espécie
de prisão preventiva onde aguardam o Juízo Final e os justos, tem seus corpos à
semelhança dos ímpios sepultados, mas, suas almas sobem para o descanso
provisório no Paraíso. É justificada a
aspiração do apóstolo dos gentios “mas temos confiança e desejamos antes deixar
este corpo, para habitar com o Senhor” [ 2 Co. 5:8, grifo
nosso].
3.3 O Fim
do Lugar dos Mortos: A Bíblia diz que Jesus se manifestou para desfazer as
obras do Diabo. [1 Jo. 3:8]. A Morte é o salário do pecado e Hades passou a
existir como parte desta maldição.
Quando todo império do mal for desfeito, a Morte será vencida, definitivamente
[1 Co. 15:26]. Então, tanto a Morte como o Hades serão lançados no Lago de
Fogo, onde estarão, também, todos os não salvos [Ap. 20:14,15]. Isso determinará
no sentido completo da palavra “a morte
da própria morte”, então, começará
o Dia da Eternidade.
CONCLUSÃO
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